23.11.08

HOJE É DOMINGO. NÃO VÁ À IGREJA!


No início de 2008 fui surpreendido por uma enfermidade que me tomou a rotina da vida normal. Porém, deste tempo, tenho comigo uma lembrança deveras saudável.
Num domingo de clima indeciso resolvi fazer uma breve caminhada. Quando estava no meio do Cambuí, em Campinas, uma chuva torrencial me surpreendeu. Tive que rapidamente me esconder no posto de combustível - o mais badalado do centro: playboys, carrões com som alto, mulheres exacerbadamente enfeitadas; e, quando olhei pra trás, uma loja de conveniência que me deixou constrangido por estar na frente, por tanta bebida alcoólica. Não aguentei a impressão que causaria, estava com muita sede e levantei-me do chão para comprar um refrigerante.

- Hei tio, você me arruma dez centavos? - um garotinho bonito, moreninho, cabelos grandes, e roupas sujas. Quase respondi a ele: "Sem chance, estou só com meu cartão de débito!" - mas o bom siso me levou a devolver a pergunta:
- O que você quer?
- O que você vai comprar aí?
- Vou comprar uma coca-cola...
- Por mim tudo bem, eu aceito uma coca também!

Olhos desconfiados nos acompanharam até a geladeira. No caixa, ele não parava de perguntar o que era cada coisa para a impaciente mulher. Dei a lata a ele, e coloquei a mão em seu ombro. Ele abriu a mochila e enfiou a lata gelada lá dentro:

- Hei rapaz, você vai guardar a lata geladinha?
- Vou, preciso levá-la pra casa...

Eu engolia gelado, mas naquela hora nada molhava minha garganta quando senti que aquele pequeno garoto podia quebrar a pedreira do meu coração desconfiado, viciado em perigos, religioso, e culpado por não estar dentro da igreja naquele horário. Eu não estava ali por acaso. Este sentimento acelerou meu coração. Quando assentamos no chão, ele me surpreendeu mais uma vez:

- Me ajude a contar quanto tem? Eu não sei contar dinheiro - disse esparramando um montão de moedas.

Pensei, "Que inocência. Eu poderia roubá-lo!". Logo fui invadido por grande tristeza. Sim! Fiquei muito triste comigo. Pois quando eles vêm à minha porta, eu subo o vidro, vejo se não há objeto que chame atenção no banco ao lado. Desligo o som pra não atraí-lo. Meu Deus, eu tinha que contar moedas de um pedinte que não liga pra valores... Será que ali eu estava ouvindo alguma mensagem que num banco de igreja não ouviria?

- Tem vinte e oito reais!
- Quanto falta pra quarenta, tio?
- Quem disse pra você levar quarenta? - perguntei raivoso, pensando num adulto mandão sobre crianças na proximidade.
- Ninguém! É que hoje, só eu pude vir pedir. Meus irmãos ficaram com minha mãe, doente. Aí pensei em levar um tanto que ajudasse por todos. Bom, "brigado" por me ajudar. Tchau!

Tudo o que sei é que seu nome era Mateus, e tinha dez anos. Eu, com um ridículo sentimento de culpa por não estar na igreja como todos, tive uma experiência quebrantadora em pleno bairro de ostentação. Será que Deus estava ali? Claro! A Bíblia diz que Ele "habita com o abatido", e não em templos feitos por mãos humanas. Não quero incentivar quem tem amarguras. Quero "cutucar" quem bate no peito por ir sempre!

Naquela tarde, voltei pra casa pensando: "Porque aos domingos gostamos de colocar boas roupas e ir em igrejas com boas bandas, e pastores que falam bem, e nossa avaliação é sempre baseado no quanto nosso emocional é envolvido?".

Orei pedindo perdão ao meu Deus. Pois Ele se faz presente com os pobres, os abatidos, os tristes... Com ricos, com afinados, bem vestidos também. Não em "mantras-gospel", oratórias gritadas, pedantismo "no grego e do hebraico isso é...", etc.

Mas por que procuramos estar com estes e não com aqueles para prestar culto? É porque "cultuar" pra muitos de nós ainda não é celebrar a vida, a despeito do que passamos. Ir ao culto, é manter a "santa rotina pra alívio de consciência". Não importando se o coração tornou-se mais de Cristo e menos do ego.

O Mateus, mostrou pra mim, que se eu estivesse num culto naquele domingo, na terça-feira pela manhã já nem me lembraria dos doentes citados em oração, nem da mensagem pregada. Eu precisava de um choque que me fizesse amar. O acontecido foi em fevereiro e não sai do meu coração que aquele encontro fora "o copo d'água fresca que servi a um pequenino" (Mt 10:42).

Busque a Deus independente dos lugares, e você não precisará esperar os domingos chegarem. Pois a vida é o espaço que Ele deseja se revelar a você. Não somente em dias e horários religiosos.

Hoje é domingo, e daí? Poderia ser segunda...

com carinho,

3 comentários:

  1. Pastor...

    Que maravilha esse texto...

    A muito não vejo tanta lucidez sobre a real condição cristã nessa "redoma gospel" que vivemos...

    Que Jesus continue falando ao seu coraçao...

    Sergio Castro
    Coconut Creek - FL

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  2. Meu "amigo"pastor é bom ver que Deus ainda tem os seus "sete mil" entre milhares e dezenas que não se dobraram ao sistema do mundo gospel que nos deixa pedrados e legalístas em nome de uma religiosidade vazia e fútil.também sou pastor da igreja do nazareno em mococa e quando li seus textos tive vontade de agradeçer a Deus por não ser uma única(pretenção)voz no deserto da espíritualidade.As vezes ao pregar com estas convicções me sinto ridiculo e ainda muito romantico,mas suas letras me incentivam ,pois sei que se nos calarmso as pedras clamarão.Cá entre nós sou mais as pedras...kkkk.Um grande abraço meu querido e parabéns pelos textos que despertam a consciencia e propõe uma contracutura com projeto de vida eterna e não de faixada.Deus te abençoe!!

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  3. marcelo munhoz de piracicaba18 novembro, 2009

    querido amigo davi,

    sair da religiosidade é dificil, mais se esforçar para não mais voltar a ela como vc e nós aqui de piracicaba estamos fazendo, está dando sentido a nossa vida, simplismente evangelho e nada mais.

    marcelo munhoz.

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